Certa vez ouvi alguém dizer: Eu invejo Kevin. Meu irmão Kevin acredita que Deus mora embaixo da sua cama. Pelo menos foi o que o ouvi dizer uma noite. Ele estava rezando em voz alta no escuro em seu quarto e eu parei junto à porta para ouvir. “Você está aí, Deus?”, ele perguntou. “Onde você está? Ah, tá bom. Embaixo da cama.” Sorri levemente e fui de mansinho para meu quarto. As observações singulares de Kevin freqüentemente são muito engraçadas. Mas, naquela noite, alguma coisa ficou no ar depois que sorri.
Eu percebi, pela primeira vez, o mundo completamente diferente em que vive Kevin. Ele nasceu faz trinta anos, com problemas mentais devido a dificuldades na hora do parto. Exceto pelo seu tamanho (1,80m), são poucas as coisas em que parece um adulto. Ele pensa e fala como o garoto de sete anos… que sempre será. Provavelmente, sempre irá acreditar que Deus vive embaixo de sua cama, que Papai Noel é quem coloca os presentes embaixo da árvore todo Natal e que os aviões voam no céu porque existem anjos que os seguram. Me lembro de já ter pensado se Kevin percebe como ele é diferente.
Será que alguma vez ficou insatisfeito com sua vida monótona? Levanta-se antes do amanhecer todos os dias, vai para o trabalho numa loja de excepcionais, vem para casa e leva nosso cãozinho para passear; na volta, janta seu prato favorito de macarrão com queijo e, mais tarde, vai se deitar. A única variação em sua rotina é o dia de lavar roupa. Nessa ocasião, fica todo empolgado ao redor da máquina, como uma mãe junto a seu filhinho recém-nascido.
Ele não parece nunca ficar insatisfeito. Corre alegremente para pegar o ônibus toda manhã, ansioso por mais um dia de trabalho simples. Fica apertando e soltando as mãos de modo excitado enquanto a água ferve no fogão antes do jantar e vai se deitar mais tarde duas vezes na semana para poder juntar toda a roupa suja para sua atividade na lavanderia no dia seguinte.
E no sábado… Ah, os bem-aventurados sábados! Esse é o dia em que meu pai leva Kevin ao aeroporto para tomar refrigerante, ver as aterrissagens e ficar imaginando o destino de cada passageiro, enquanto bate palmas. Fica tão ansioso esperando o sábado que dificilmente dorme na noite de sexta-feira.
É assim seu mundo de rituais diários e idas ao aeroporto nos fins de semana. Ele não sabe o que é ficar descontente. Sua vida é simples. Nunca irá conhecer a complexidade da riqueza ou do poder e não liga a mínima para a marca de roupa que usa ou para a sofisticação ou não da comida que come.
Suas necessidades são sempre atendidas e nunca se preocupa com a possibilidade de um dia isso não acontecer. Suas mãos são ágeis. Kevin nunca está tão contente como quando está trabalhando. Quando ajuda no serviço da casa ou passa o aspirador no tapete, põe todo seu coração na tarefa. Não procura acabar depressa ao começar um trabalho e não pára antes de terminar. Mas quando termina suas tarefas, Kevin sabe como relaxar.
Nunca fica obcecado com seu próprio trabalho ou com o dos outros. Seu coração é puro. Ele ainda acredita que todos sempre dizem a verdade, que promessas devem ser cumpridas e que, quando você erra, deve pedir desculpa em vez de discutir. Livre do orgulho e sem preocupação com as aparências, Kevin não tem vergonha de chorar quando se machuca, se zanga ou fica triste… Ele é sempre transparente, sempre sincero. E confia em Deus. Sem ser cerceado por razões intelectuais, ao se aproximar de Cristo, o faz como uma criança.
Kevin parece que conhece Deus – parece ter uma amizade com Ele de uma maneira que é difícil para pessoas “preparadas” compreenderem. Deus parece ser seu amigo mais íntimo. Nos momentos de dúvida e de frustração em minha fé cristã, invejo a segurança que Kevin tem em sua fé simples. São nessas ocasiões que realmente aceito que ele tem um conhecimento das coisas divinas que transpassam minhas dúvidas de simples mortal. É quando percebo que talvez não seja ele quem tenha uma desvantagem – sou eu.
Meus deveres, meus temores, meu orgulho, minhas pompas – tudo! – se transforma em desvantagens quando não os entrego aos cuidados de Deus. Quem sabe Kevin compreende questões que nunca entenderei? Afinal, ele passou a vida inteira nessa santa inocência, rezando à noite e inundando-se na bondade e no amor de Deus. Um dia, quando os mistérios do além se revelarem e nos surpreendermos ao sabermos como Deus sempre esteve tão perto de nossos corações, eu saberei que Deus ouviu a prece simples de um garoto que acreditava que Ele vivia embaixo de sua cama.
Mas com certeza, não será nenhuma surpresa para Kevin!
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