Era sábado pela manhã a companhia responsável pela formatura e baile acertando os últimos detalhes no auditório da Universidade e no Salão Nobre. Todos estavam ansiosos, preocupados, assustados, cheios de expectativas.
Carros iam e vinham da portaria da universidade, o pessoal da decoração dava os últimos toques na arrumação da mesa do Corpo Docente. Três da tarde. A cerimônia iria começar às 4, impreterivelmente. O Reitor da Universidade, não se dava ao luxo de começar um minuto atrasado. Assim, acontecesse o que acontecesse, às 4 horas a cerimônia iria começar.
Muita gente chegando. Uma grande festa. Lugares contados, reservados para duas ou três pessoas de cada formando. Havia um telão para que todos acompanhassem do lado de fora. Primeiramente a entrada do Reitor. Então a mesa diretora e, por fim, o corpo docente. Cantaram o Hino Nacional.
No momento da entrada, as torcidas no meio do auditório, levaram faixas, cada um se emocionava do seu jeito. Umas garotas choravam. Os rapazes erguiam as mãos como se fosse um gol do seu time. Outros faziam o “V” da vitória, e um a um foram chegando com suas togas bem alinhadas.
Chegada a hora de passar a palavra ao orador das turmas o Julinho, foi aclamado, quase levado nos braços dos formandos, seu discurso havia sido impresso para todos acompanharem.
“Ilustríssimo Reitor, Senhores professores, etc….etc….
Tudo ia muito bem. Até que Julinho se engasgou, ao dizer uma palavra que estava além do texto: “Agora, Senhor Reitor e senhores formandos, preciso dizer algo pessoal… ” Os formandos gelaram. – “Ele vai fazer besteira” Mesmo conhecendo a cara de desaprovação da turma, Julinho continuou, branco, pálido, engasgado, mas firme, dizendo:
– “Senhor Reitor, Corpo Docente, Formandos, Familiares e Amigos:
Preciso confessar algo, para fazer justiça e, ao mesmo tempo, reconhecer o que é certo. Todas as coisas aqui foram muito importantes: aulas, colegas, a seriedade de nossa instituição, tudo.
Mas há algo que está faltando no meu texto, e não lerei o que vou dizer, porque o que tenho pra falar vem das letras escritas a ferro, dentro da minha alma. Devo este dia inesquecível e histórico às 3 da manhã de cada dia desses 5 anos.
– “Três da manhã?” Pensaram os formandos.
Nunca desfrutei de amizade com o meu pai. Na verdade, sempre o desprezei. Tanto é assim que ele não está aqui, entre os meus convidados, porque não pode se locomover e eu não fiz o menor esforço para trazê-lo. Aqui estão minha mãe e irmã, mas meu pai não. E ele é responsável pelas três da manhã.
Durante 5 anos eu acordei várias vezes no meio da madrugada, e, não raras vezes, às 3 da manhã. Meu pai, que empregou quase todo o seu parco salário no meu curso, mesmo sendo por mim ignorado, entrava no meu quarto, com muito esforço, às vezes caía, mas sempre levantava, e orava a Deus. Sim, ele me apresentava a Deus. Tenho marcas no meu cobertor que não foram feitas por doces ou refrescos que derrubei.
São as lágrimas do meu pai, que pedia a Deus para fazer-me feliz, fazer-me íntegro, para guardar-me de acidentes, para proteger-me de bandidos, para abrir o meu entendimento na compreensão das matérias, para abrir-me oportunidades de trabalho na área. Ele chorava, pedia, dizia a Deus para que tocasse no meu coração e fizesse de mim um homem e um cristão. Mas, Senhor Reitor, não foi isso o que mais me tocou. O que marcou a minha vida, e é a razão desta homenagem, era a frase com a qual ele sempre se emocionava e chorava copiosamente junto a mim. Ele dizia:
– Deus, como eu amo meu filho! Deus, como eu o admiro! Deus, como eu o quero bem! Deus, faça o que quiser comigo, mas abençoa o meu filho, porque, depois de Ti, ele é a razão do meu viver! E dá-me o privilégio de que um dia ele me ouça, que ele me ame também! Júlio chorava. O Reitor tossia, para disfarçar a emoção, os formandos estavam com a cabeça baixa, pois sabiam que o Júlio tinha feito a coisa certa e estavam envergonhados de terem desaprovado sua atitude no início. O auditório se derretia. E, num ápice de dor e amor, Júlio gritou:
– Meu pai, como eu queria te dizer EU TE AMO!
De repente a porta do corredor central se abre subitamente, e uma cadeira de rodas entra, guiada por uma enfermeira, e o pai de Júlio entra, magrinho, cabelos grisalhos, rosto cansado, voz baixa, mas grita com toda a força do seu ser:
– Eu sei que você me ama, filho! EU SEMPRE TE AMEI! Seja feliz, meu filho, seja feliz!!!
Júlio quebra o protocolo e sai correndo da tribuna corredor adentro e vai abraçar o seu pai, chorando no seu ombro. Todos, unanimemente, chorando e gritando “BRAVO! BRAVO!” Aplaudiam longamente a cena fantástica que ora se fazia viver no mundo real! Foram 5 minutos, os cinco minutos mais importantes já vividos naquela universidade!
Chamado novamente à tribuna, recebeu o seu grau e diploma. Então gritou:
– PAI, ISSO É POR VOCÊ! TE AMO!
O pai sorriu, mas já não tinha forças para falar. No seu coração ele via retribuído todo o seu esforço, o salário minguado dedicado à faculdade do rapaz, e, principalmente, as três horas de toda madrugada. Ele estava feliz. Podia morrer tranquilo. Mas, morrer, já? Ele não tinha planos para morrer agora, naquele instante. Queria desfrutar dessa grande alegria. E Deus ainda lhe deu alguns anos, os melhores da vida dos dois, do Dr. Júlio e do seu pai, que se tornaram os melhores amigos. Aliás, Júlio ficou conhecido na comunidade acadêmica como “Doutor Três Horas”.
“Honra a teu pai e à tua mãe, para que se prolonguem os teus dias, na terra que o Senhor teu Deus te dá”(Êxodo 20.12)
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